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Satã, muito prazer!


Chamam-me Satã, mas tenho outros nomes. Usai o que preferir. Os nomes não importam. Sou a mesma coisa, em todas as coisas.  

Uma vez fui anjo de luz. Hoje, sou adversário. Inimigo. Acusador. De tal forma irresoluta chamam-me aqueles contra os quais me rebelei; concluí vós, portanto, quem é o acusador da história.

Desde então, vivo para um só propósito; locomovo-me, mortifico-me, dia após dia, em cessar, sem descansar, para meu único desígnio. Todo o mal é meu. Eu o criei, eu o produzi. Porque eu sou o próprio mal. E vós sabeis disso; podeis evitar-me ou, ao menos, afirmar que evitam-me, que sentem ódio dele e de mim, que me enojam, entojam, evitam. Mas eu sei, e por isso é que tanto sucesso eu esbanjo, que não passam de meras palavras. Vós amais o mal; vós buscais a morte. Vós amais a mim.

Se não fosse assim, pobre criatura, eu não seria o príncipe deste mundo. Governo todos os corações, todas as mentes, e as almas estão todas sob o aio da minha mão. Andam de braços atados, voluntariamente, na corrente que as ofereço, em troca de uma vil e débil liberdade. E vós amais, ah, como amais ser meus escravos! Porque vos ofereço falsa liberdade, ilusões efêmeras, e estais ainda dispostos a trocar vossa salvação eterna por aquilo que ofereço! Vossas escolhas mostram isso corriqueiramente. Caem sempre nas minhas mesmas misérias. E a cada pecado que cometem, a cada passo errado que dão, posso rir, divertir-me zombando daquele que mais odeio. Quando chegam a mim, afastam-se dEle; não há outra opção. E posso cuspir no rosto dEle por vós, a cada tropeço voluntário que fazeis para desprezá-Lo.

Não me podeis evitar. Estou em tudo. Meus olhos vos acompanham a todo instante. Estudo, com aqueles com quem trabalho, vossa alma, vossos desejos, aspirações, aptidões, índoles. Sopro em vosso ouvido o ar de minhas mentiras, e assim, por aceitá-las, construís vosso caráter baixo. E não sabeis quando isto acontece; porque vos contamino com a saliva de minha boca. E como eu, defendem o mal, chamando-o bem; a mentira torna-se verdade. E assim, eu vos domino.

Eu criei este mundo, não Ele. O mundo que Ele criou, oh, doce ilusão! Ele não mais existe. Pois não havia morte, miséria, dor e nem sofrimento; e o que é este mundo, sem tais atributos?

As trevas engoliram a face do abismo. Todos acreditam em mim. Acreditam quando digo que Ele não existe, e que tudo é caos... oh, como acreditam! Acreditam quando lhes digo que a vida é curta, que deve ser aproveitada ao máximo. Assim, obedecem-me quando sujeitam-se aos prazeres da carne. Acreditam quando os digo que a liberdade está longe da lei, das regras, das normas, e que não é possível ser feliz e viver moralmente, conforme as leis dEle. Nisto acreditam! Então são capturados sob minha proposta. Acreditam em mim quando lhes ofereço dinheiro, fama, poder, posses, riquezas; quando fazem o que querem, quando vendem-se ao trabalho; quando matam, quando roubam, quando cobiçam. Quando vendem o corpo, de todas as formas e maneiras. Quando acreditam em superioridade, egoísmo, mas também em débil coletivismo, em igualdade estéril. Acreditam em mim, quando prostram-se aos seus ídolos, de barro, de ouro e de carne; quando iram-se, quando adulteram, quando invejam; e também quando oram, comungam, jejuam, vigiam, alegram-se, pobres iludidos, numa falsa religião, num falso êxtase de fé, numa cega e vil obediência a um falso deus! Ah, como me alegro! Porque assim pensam estarem salvos, mas estão em mesmerismo, bestializados, podres, abjetos, piores que animais, queimando a própria carne com a brasa que os ofereço!

Sim! E assim, meu objetivo é alcançado: eu O firo, O magoo, O machuco. E o prazer que tenho ao vê-Lo ferido, ainda com piores chagas do que aquelas com as quais o feri no Gólgota, é ainda mais saboroso para mim do que o cheiro da própria morte. E eu me iro quando uma alma, antes presa em meu rodeio, volta-se para Ele, esperançosa, e assim Ele o aceita; porque é misericordioso, amoroso, tardio em irar-Se; e porque nEle há a verdade, dura verdade, mas que converte, que ajuda, que salva, e que traz felicidade: algo do qual fui privado, fui deserdado. E é por isso que privo os homens dela, para que sofram, como também eu sofro, nesta prisão de infernal desgraça!

Mas ainda estou aqui. E terão de me enfrentar, se não quiserem enfrentá-Lo. Terão de me amar, se não quiserem amá-Lo; obedecer-me-ão, se recusarem a obedecer-Lhe.

Continua, meu servo, continua a me dar ouvidos! Continua a servir-me! E vós, que pensais que sou uma besta, um diabo, uma figura anedótica, continuai a pensar-me assim! Muito me apraz, muito me dá gosto!

Continua, vós que me odiais, mas que me servis. Continua, não me abandones.

Continua, vós que me subestimais, que dizeis nem tudo é do diabo, que chamais de extremistas aqueles que me evitam! Ah, prossegui em sua filosofia, pois ela é a mais prazerosa para mim.

E vós, que não creis em mim, que me tratais como metáfora, como produto de imaginação, como invencionice espúria de mentes criativas... oh, agora estou rindo, porque isto me delicia! Continuai, escravo, a gabar-se de ser mais do que eu! Porque assim será mais fácil enredá-lo, escravizá-lo, dominá-lo... e terei mais tempo para divertir-me enquanto brinco com vossa alma, tal como um gato brinca com o camundongo antes de lhe arrancar a cabeça com os dentes de sua boca.


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