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Mendigos mafiosos e o perigo de você fazer o bem.

 


O teólogo Yago Martins resolveu fazer um tipo de pesquisa diferente. Então, passou um ano fingindo ser um mendigo para entender a realidade das ruas, e o que ele viu foi surpreendente.


Com isso, ele escreveu um dos livros mais polêmicos de 2019: "Máfia dos Mendigos, como a caridade aumenta a pobreza". Entretanto, ele recebeu bastante críticas pelo nome que parece um ataque aos ensinamentos de amor ao próximo (Jo 15:12). Porém, é justamente o contrário.


Nesse livro, ele relata que conheceu mendigos com casas e família, que não precisavam necessariamente de "uns trocados" ou um prato de comida. O vazio deles era no coração e não na barriga. Contudo, nós não sabemos disso. Achamos que moradores de rua são todos iguais e com isso não conhecemos suas reais necessidades.


Em um dos trechos do livro, diz o seguinte:

"Mas quantas vezes olhei para um morador de rua como algo além de sua condição financeira? Quem se senta com um mendigo em uma praça para saber a vida por trás daquela vida? Só nos sentamos com eles para falar de fome, miséria, de dor. Só iniciamos um contato para oferecer um pedaço de pão. Ninguém começa um diálogo com um morador de rua acreditando que pode encontrar algo além do que a personificação da fome."


A grande crítica é a falta de engajamento com as pessoas. Damos comida a um mendigo, pois faz bem ao nosso egoísmo moral, para cumprir um desafio da igreja e tirar uma "fotinha", para se sentir um cristão melhor e não realmente para ajudar as pessoas.

Pelo contrário, ajudar necessita de tempo que nem sempre estamos dispostos a dar. 


Em Lucas 10:30-37 Jesus conta uma das minhas histórias preferidas: a parábola do bom samaritano. Inquestionavelmente Jesus deixa explícito o que é ajudar alguém e se importar com ela. Ou seja, o bom samaritano não ajudou o rapaz e foi embora, pelo contrário, fez tudo o que podia, dedicou tempo e dinheiro e ainda prometeu voltar para pagar o resto da dívida.


Percebe? A palavra mais tônica nessa história é o "voltar", participar, se importar com a vida dele.  Ele poderia muito bem dizer "quando ele melhorar, ele que lute pra pagar tudo, já fiz minha parte". Porém, ele não teve esse tipo de pensamento.


Nesse contexto, não estou dizendo para você negar um prato de comida ou não aliviar as necessidades urgentes do indivíduo. Estou só alertando para não ser como Caim, que queria fazer algo bom, porém, com o coração cheio de intenções ruins (História da redenção, pág 52).


Você usa o pobre para seu entretenimento moral, para se sentir bonzinho? Ou por realmente querer ajudar alguém com todo o teu coração? 

Você faz o bem pois sente piedade e misericórdia? Ou só para cumprir um requisito da sua igreja?

Você realmente está disposto a se engajar com as pessoas? Ou só quer fazer algo para ficar de consciência leve?


Em outro trecho do livro diz:

"Durante todo o período em que tentei encontrar um morador de rua, na maior parte do tempo encontrava a mim mesmo. Cada desvalido era um espelho da minha própria condição humana. O que me distinguia do homem sobre o papelão não era tão profundo, às vezes era o nível de instrução,  outras vezes a estrutura familiar, muitas vezes percepções morais que nos levaram a momentos distintos na vida. Por mais que houvesse distinções, na justificativa que visse o morador da mesma forma que se via os cachorros do bairro."

e logo em seguida:

" Sejamos sinceros, ninguém se sente confortável contemplando o mal no mundo. Somos rodeados de miséria, doença e morte, mas preferimos ignorar o que nos tira a paz. Olhamos fixos para a frente e apressamos o passo quando o mendigo fala conosco, subimos o vidro do carro. pessoas deitadas na porta da catedral são infortúnios para nosso turismo de férias. Damos esmolas mais para despachar o "sujismundo"(1) que atrapalha nosso jantar romântico do que qualquer desejo de promover caridade(...) Você só consegue descobrir o quanto de si há  mendigo e quanto do mendigo há em si quando se olha no espelho e sabe o que está por trás da sujeira."


Muitas dessas pessoas não precisam de comida ou alívios passageiros. Contudo, precisam se reconciliar com as famílias, precisam de consolo espiritual, precisam de um ombro amigo, precisam contar sua verdadeira história. Porém, tudo isso nos custará tempo e disposição. E aí crente? Está disposto a realmente ajudar?

por: Douglas Luan


REFERÊNCIAS:

(1) "sujismundo" é um personagem de animação dos anos 70 que virou sinônimo de pessoa suja. http://www.infantv.com.br/infantv/?p=16901 

https://youtu.be/gm-G-cqxOzk (Passei um ano me fingido de mendigo)

https://www.youtube.com/watch?v=07bUZIDfPus (Pastor se finge de morador de rua para escrever livro)

https://www.youtube.com/watch?v=XeckKf6q6zw&t=280s (DESVENDANDO A MÁFIA DOS MENDIGOS | Baixo Clero #14)

https://www.amazon.com.br/m%C3%A1fia-dos-mendigos-tentativas-fracassando/dp/8501116904  (livro para compra)

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